sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Consciência e cidadania no Brasil

No processo de ultrapassagem do estado colonial para o estado-nação, pós-emancipação política com Portugal em 1822, todo o aparato jurídico no Brasil utilizado continuou sendo o português, afinal, não se constroem Leis de um dia para a noite. 

Isto não é pouca coisa, sobretudo numa nação de baixo letramento e cuja elite econômica e intelectual estudava na Europa, especialmente em Coimbra.

Tal situação resultou numa falta de clareza sobre o papel da Justiça, seus meandros, ordenanças e como setores médios deveriam encarar as culturas políticas e jurídicas. 

A elite brasileira se utilizou da herança metropolitana como estratagema de manutenção de privilégios, isto explica, por exemplo, por que no Brasil do século XIX e até os dias atuais a cultura bacharelesca, leia-se médicos e advogados serem chamados de “doutores”, mesmo sem terem feito doutoramento, afinal, pertencia a uma pequena parcela da sociedade com formação acadêmica. 

As consequências do distanciamento entre setores populares e o acesso à Justiça tem implicações até os dias de hoje. Brasileiros, grosso modo, possuem uma cultura política e jurídica a partir de uma concepção de distanciamento, ou seja, não fazem parte do tecido social, não se sentem representados, não acreditam em justiça social e usam da premissa de que a política é um grande balcão de negócios utilizada para o toma lá da cá. 

O esgarçamento social no Brasil é notório, assiste-se a um processo de pragmatização das questões sociais, um enriquecimento e aceleração do consumo desatrelado da perspectiva de qual deve ser a função do estado e do cidadão. 

É bem verdade que os índices sociais melhoram, no entanto, o Brasil ocupa a penúltima colocação quanto ao quesito qualidade de ensino. 

Claro também que não devemos esperar apenas do ensino formal, ou seja, não se aprende apenas na escola, mas no Brasil ainda não atingimos o patamar de sabermos o que é o ensino universal, gratuito e de boa qualidade. 

Quanto à cultura jurídica, é bem certo que nem toda questão jurídica é política, entretanto, não podemos esperar uma marcha ética nesse país, uma grande revolução nos costumes enquanto não houver uma grande revolução na educação, digo formal mesmo, depois na educação ampliada, ou seja, nos processos culturais de compreensão sobre ética e cidadania.  











quinta-feira, 29 de novembro de 2012

O imperialismo brasileiro

Gaetano Mosca, Pareto e Gramsci, foram três teóricos que se debruçaram sobre o conceito de elite, embora este último se diferencie em muito da concepções dos dois primeiros. Não é difícil entender porque três italianos no inicio do século XX se debruçaram sobre o tema. A Itália era um país recém-unificado com vários problemas quanto à integração nacional, aliás, até hoje, fortemente marcado pelo poder da igreja católica, também até hoje.

Na Itália de então o problema nacional perpassava pelos projetos de poder. Gramsci, por exemplo, cunhou o conceito de sociedade ampliada: a junção entre poder de estado e sociedade civil, com vistas ao entendimento de como os italianos pensavam, como a elite orquestrava suas estrategias de dominação.

Guardadas às devidas proporções, Itália e Brasil no início do século XX se assemelhavam em dois aspectos: a questão da nacionalidade e o poder da igreja católica. Lá como aqui, a elite brasileira, a nova, oriunda da riqueza da cafeicultura, também desenhava seus projetos de poder.

O problema é que a elite brasileira desde o surgimento do estado nacional pós-emancipação política com Portugal em 1822 disse a que veio. No processo de ruptura política alijou os pobres, negros e índios e durante todo o século XIX usou de toda a força possível para debelar qualquer ato de insubordinação, as revoluções, tais como: Cabanagem, Sabinada, Balaiada, Farroupilha, antes disso, já havia sufocado a Confederação do Equador, atrasou o quanto pode a emancipação dos escravos e usou a força do estado para debelar Canudos, já em fins do XIX.

No inicio do século XIX anexou o Uruguai e todos os países vizinhos ao Brasil tinham uma relação de desdem e de desconfiança do império brasileiro, consideravam que a qualquer momento "o gigante pela própria natureza" pudesse invadir seus territórios, fazer o mesmo com eles o que havia feito com o Uruguai.   

A máxima expressão da força da elite brasileira, dependente do imperialismo britânico, foi demonstrada na Guerra do Paraguai, em que ao lado de Argentina e Uruguai massacram o vizinho exterminando homens em idade produtiva, sob o pretexto da ameaça Paraguai, leia-se "imperialismo guarani". 

Parece que os brasileiros se esqueceram dos 300 anos de colonização portuguesa, do imperialismo britânico ditando as regras da politica brasileira (1822 - 1889) e do imperialismo estadunidenses (1918 - 2001), vide as práticas econômicas exercidas na África e na América Latina. 

Na África, empresas brasileiras exploram as riquezas de Angola, constituindo Luanda enquanto economia de enclave. Em Moçambique, fazendeiros brasileiros compraram grandes extensões de terra para plantação de soja, tal como no Paraguai, afora o problema da falta de competitividade entre as indústrias brasileiras e as do resto do continente. Fogões, geladeiras, carros, postos de combustíveis dominam cidades latino americanas. A desproporção entre a riqueza brasileira e os demais países é grande demais.

Ainda assim, os índices sociais brasileiros são os piores da região, ou seja, possuímos uma das piores distribuições de riqueza do planeta. Nossa educação é uma piada, caso de polícia.  

Os brasileiros estão convencidos, orgulhosos do momento de crescimento econômico, mas se esquecem que reforma econômica sem reforma social é "programa para inglês ver" (expressão do século XIX) indicando apenas fachada, perfumaria, sem mudanças estruturais. 

Quando essa onde de crescimento passar, a próxima região de crescimento será a África, veremos o tamanho do rombo de nossas riquezas que singraram mar afora sem grandes retornos sociais.

Onde fica o papel da elite brasileira, aliás, a pior do mundo? Basta olhar a reclamação quanto aos programas sociais como "bolsa-família", "minha casa, minha vida", "prouni", "vale gás", além do impedimento da taxação das grandes fortunas, da taxação dos lucros dos bancos privados, e de qualquer coisa que atrapalhe seus planos. 

No Brasil as revoluções sempre foram sufocadas com muita violência, sem esquecer do apoio da elite brasileira a implementação da ditadura militar. 

Estamos perdendo um excelente momento de discutirmos os nossos grandes problemas nacionais: reforma agrária, distribuição de renda, educação ampliada, gratuita e de boa qualidade, saúde decente, segurança, habitação, reforma da justiça, distribuição de canais de televisão, reforma politica, fiscal. 

Se ao menos a elite brasileira fizesse investimento social, ou seja, devolvesse parte do que tirou do povo brasileiro, vá lá, mas os exemplos são muito poucos. 

A elite brasileira é autoritária, imperialista e anti-democrática.     

                      

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Subindo e descendo a montanha

Viver é como subir uma montanha gelada, sentir o calafrio, ter medo da descida, olhar para baixo, não enxergar a chegada, cair ao tentar se locomover, levantar, começar a descida;

é como sentir o frio gelado no rosto, olhar para trás e ver que o ponto de partida vai ficando cada vez menor que o de chegada;

é como marchar como anônimo contra a injustiça, porque a dignidade é a verdadeira casa do humano;

é como andar por uma cidade e conhecer os lugares onde teus escritores prediletos nasceram e viveram, imaginando o que sentiram, pensaram e sorveram;

é como andar no contra-fluxo do trânsito apressado, buzinas, engarrafamentos, a passos lépidos;

é como aprender uma receita nova, apreciar um gosto diferente, sentir um aroma novo, deliciar um prato e fazer hhuuuuuuummmmm;

é como querer comer um prato de comida e não ter o que comer;

é como cantarolar aquela canção e receber um sorriso;

é como cantar e não receber sorriso nenhum;

é como perder o caderno de anotações, sentir-se triste, ter esperança de que quem o encontrou continue a preencher suas páginas com suas histórias, constituir outro caderno ali mesmo onde perdeu o primeiro, abrir suas páginas em branco, passar a mão em suas folhas amarelas, começar a escrever de novo;

é como voltar para casa, encontrar tudo em seu lugar e saber que nada será como dantes, pois que tudo mudou dentro de si;

é como receber abraços bem apertados de quem mais a gente ama e saber que nem tudo mudou dentro de si; quem mais importa estava esperando ansiosamente como a espera das voltas de um relógio que são mais lentas para quem não parava de olhar para ele, no anseio de que o tempo voasse tão rápido quanto o pensamento que leva até você;

viver é como fazer e desfazer as malas continuamente, como uma grande viagem ininterrupta, arrumando as gavetas internas, trocando as roupas da alma, como disse o grande poeta Mário Quintana;

é como encontrar "A montanha por achar", de Fernando Pessoa;





terça-feira, 27 de novembro de 2012

Governo Roseana Sarney: a anti-modernidade brasileira

Se tomarmos como parâmetro os conceitos de Norberto Bobbio sobre oligarquias, encontraremos 21 tipologias sobre esse tipo de governo, incluindo ai as que existem em regimes democráticos. É o caso do Maranhão.
 
Esse estado, um dos mais pobres do pais, possui os piores indices de IDH (Indice de Desenvolvimento Humano), uma das maiores concentrações fundiárias do pais, gravissimos casos de assassinatos de camponeses, assiste ao esvaziamento de sua região central por conta do agrobusiness,
pouquissimas redes coletoras de esgotos, baixa escolaridade, dentre tantas gravidades.
 
Tal estado é governado desde 1966 por uma única familia: os Sarney's. Tal familia controla um setor considerável da mídia, todo o aparato burocrático do Estado, setores da justiça, legislativo, empresarial, enfim, existe no Maranhão uma cultura oligárquica, responsável pelo atraso cultural dos maranhenses.
 
Cultura oligárquica não é apenas o controle do poder executivo, são relações e associações de redes que permeiam a esfera pública e privada, portanto, é a concepção de que o Maranhão tem dono, e tem mesmo. Aqui prevalecem o medo, o patriarcalismo, o clientelismo, a lei do silêncio. Poucas pessoas assumem ou tem coragem de denunciar abusos dessa familia.
 
A anti-modernidade do governo Sarney pode ser expresso, por exemplo, no abandono em relação à Universidde Estadual do Maranhão. Sem receber os recursos há 3 meses, tal Universidade morre à mingua. Falta tudo, inclusive pagamento de salários para terceirizados, programas especiais, bolsas de iniciação científica, monitorias, telefones, pagamento de díarias, passagens, etc.
 
Universidade é fator de desenvolvimento, vide os casos de São Paulo, as estaduais: USP, UNICAMP, UNESP, exemplos de pesquisa e retorno social, além das paranaenses, UEL e UEM, da Estadual da Bahia, do Piaui, dentre tantas universidades estaduais.
 
A UEMA é a única Universidade estadual, a outra, a UFMA, pertence ao governo federal, de lá saem os recursos, e as infra-estruturas entre as duas não tem comparação.
 
A Europa assiste a sua maior crise social desde a segunda guerra mundial, exatamente pela concepção liberal de redução do estado, ou seja, lá começa a prevalecer a opinião da existência do estado mínimo e os sinais disso são visiveis: mendicância, violência, desemprego, pobreza, queda na qualidade de vida, desestruturação do sistema educacional, dentre outros elementos.
 
O Brasil, ao contrário, se tornou a 5ª potencia econômica do mundo, mas no Maranhão os sinais de pobreza estão por todos os lados e a responsável por isso é a oligarquia Sarney, mandatária do Estado.
 
Deixar uma Universidade à míngua é qualquer coisa de anti-moderno, é estar na contra-mão da história.     

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

A última crônica

 É pequeno. Colorido. Possui desenhos de Bukowsky. Foi um presente de minha amiga Patrícia. Nos 5 últimos meses, foi meu parceiro fiel. Neles estão registrados tudo o que meus olhos viram, tudo que meu coração sentiu, o que minhas mãos rabiscaram. Estava sempre perto de mim, sempre.

Ontem à noite, exatamente a última em terras longínquas, depois de me acompanhar na última taça de vinho, de registrar minha última poesia-crônica, telefonei para minhas filhas e ele estava a me acompanhar nessa felicidade. Estava ali, exatamente embaixo do telefone público. Eu trocava as palavras das mãos pelas da boca.

Minhas filhas queriam saber de tudo: se meu dedo que escreveu os nomes delas na neve ainda estava congelado, se fazia muito frio, se eu estava bem agasalhado. Silenciosamente meu companheiro ouvia tudo e não dizia nada. Sabia que mais cedo ou mais tarde suas páginas registrariam alguma percepção, alguma sensação, alguma emoção. Os créditos caíram, terminaram, saí à procura de mais um cartão telefônico. Foi a primeira vez que o esqueci. Na volta estava lá ainda a me esperar.

Conversei ainda mais com minhas filhas, foram longos minutos. Perguntavam quantos dias faltavam para eu chegar, morriam de saudades, queriam brincar na neve comigo.

Fui alegre e altaneiro para o hotel. Ao amanhecer, desesperado, procurei pelo meu caderno, me vesti subitamente e corri numa manhã gelada de Lisboa; gente apressada à procura do metal, carros que iam e vinham. À medida que eu corria, me passava pela cabeça os momentos que passamos juntos, palavras, sensações, anotações, desejos e esperanças.

Finalmente avistei a praça, o telefone público. Vazio. Não estava lá. Ainda perscrutei pelas cercanias se alguém havia visto, nada. A tristeza tomou conta de mim.

De volta ao hotel nem mesmo a imensidão do Tejo me reanimou.

Agora vamos nos separar pela imensidão do mar. Não sei quem o apanhou. Nele contém minha intimidade, meus grafos e impressões. Quem o abrir terá acesso a parte de mim, de quem sou. Mas não é isso que me incomoda, e sim, a incerteza sobre seu futuro; se rasgarão suas páginas; se descontinuarão suas histórias ali registradas; se farão de suas folhas embrulho.

Alimento a esperança de que quem o achou que continue suas páginas a preencher com poesias, crônicas e contos, para isso ele existe. Ficará triste se destinarem outro fim. Eu conheço sua sensibilidade e delicadas páginas amarelas.

Agora estamos separados, talvez para sempre. Uma parte de mim que fica nesse lado do Atlântico.

Todas às vezes que eu rabiscar novas palavras, vou me lembrar de meu velho parceiro, foi meu fiel companheiro.

Toquinho, cantor e compositor brasileiro, na canção O caderno faz um pedido solene para quem possua o caderno não o esqueça num canto qualquer. Eu, por uns instantes o esqueci, o suficiente para perdê-lo, para sempre.

A vida é assim, feita de perdas e ganhos.

Eu te perdi fisicamente, mas tuas páginas estão guardadas para sempre dentro de mim.                         

   

domingo, 25 de novembro de 2012

Memoráveis n 2

COISAS PARA SE GUARDAR:

Estar com amigos, a mesma casa, o mesmo calor humano;

Viajar de trem vendo o mar Adriático;

Sentir o Bora em Trieste;

Seguir os passos de James Joyce, Umberto Saba e Italo Svevo;

Rever La Serenissima;

Comer pesto em Gênova;

Aprender a cozinhar com Cesare;

Discutir Antropologia com Anna;

Fazer uma torta com Irene, errar os ingredientes, rir de si mesmo;

Tocar a neve, escrever os nomes de minhas filhas naquele imenso tapete branco e gelado, sentir a neve derreter e passar pelo meu tênis de pano, congelar os pés;

Admirar as montanhas nevadas de Brenta;

Quedar-se ante a beleza do Lago Idro;

Sentir-se cidadão do mundo;

Ver toda a gente aplaudir de pé o time feminino de handebol Athlético Petroléos de Luanda, Angola, no voo entre Madrid e Lisboa, vencedor do campeonato africano da competição.   
   
     
                     






sábado, 24 de novembro de 2012

Montecuccoli: ouvero una zuppa inglese aerea

Receita para um bolo refinado e gostoso:

Junte uma casa construída na época do Renascimento, cheia de objetos de arte por todos os cômodos, uma tradição secular de cozinhar pratos a partir das várias influências culturais, uma jovem cozinheira que não fala português, um brasileiro que não fala italiano, 4 ova - solo tuorli, zucchero, marsala, panna montata, cacao, alquermes, savoiardi (4 ovos, açúcar, biscoito, licor, chocolate, cola de peixe e conhaque).

Comece se enrolando todo sem entender bem como os ingredientes são misturados. Irene, a jovem mestre cuca, pediu que eu usasse um avental e, de súbito, reclamou do ângulo que eu mexia os ovos, risos. Depois, por eu ter colocado todos os ovos com a clara e não apenas as gemas, alterou substancialmente a consistência do creme. O problema foram os micro-grumos. A coloração ficou feia. Pronto!!! Quando Irene percebeu que a coloração e a consistência não eram adequadas, decidiu fazer tudo de novo. 

- Speta Irene, Speta!!! Disse eu tentando acalmá-la e tentando entender o que havia feito de errado. Aí, apareceu Cesare, Anna e Carlo, todos falando italiano muito rapidamente, discutindo aristotelicamente o problema da coloração e da consistência e o quanto a angulação que eu havia mexido os ovos alteraria substancialmente o sabor. Refeito o procedimento, terminamos o bolo. 

Depois foi a vez do jantar. Muitos italianos juntos, 8 garrafas de vinho e o assunto como sempre: comida. Disse que havia adorado o pesto de Gênova. Resposta: – “Óbvio, o melhor manjericão tem que nascer em regiões próximas ao mar e olhar para ele”. Exatamente!!! Manjericão, bom é o que olha para o mar!!!!!!

Meu amigo Cesare, excelente cozinheiro, havia feito de antepasto (na Itália, como na França, existem 2 ou 3 entradas antes do prato principal) maravilhosos bolinhos de jerimum, impecáveis. Sabe quanto a italianada classificou? Nota 6. Isso mesmo, apenas 6 de média. 

Quanto aos vinhos, eu mesmo fui à adega e escolhi alguns franceses e italianos. Sabe o que disseram? Não eram tão bons quanto os de Carpi, região de onde todos eles eram.... Risos. E olha que escolhi um italiano Pinot Noir, minha uva preferida, sensível, delicada e absolutamente singular. Estava excelente. 

O segundo prato foi uma espécie de arroz com camarão frito com folhas de verva. Maravilhoso!!!! O problema é que não foi aprovado porque consideraram aquele prato muito próximo a uma massa, Cesare não havia dito que o segundo prato era uma massa. Risos. Essa discussão se o prato era uma massa ou não durou algo em torno de 30 minutos, com muita gesticulação de braços.

O terceiro e último prato foi um .... não quis dizer se era maravilhoso ou não, mas era carne de Cervo. Esperei primeiro eles darem opinião. Dessa vez elogiaram, sem olvidar, claro, uma espinafrada:  – “A carne era tão boa que qualquer cozinheiro acertaria fazê-la”. Risos.

Por fim, como sobremesa, o tão esperado Montecuccoli feito a quatro mãos, minhas e as da Irene. Aprovaram...... Risos.

Ficamos umas quatro horas na mesa, depois das brincadeiras sobre a aprovação ou não dos pratos, começamos a discutir política e o futuro da Itália, além da situação brasileira. 

Na Itália, assim como em outros lugares, existe uma sociabilidade da mesa; ali há um agrupamento em que as relações pessoais se estreitam, amizades são solidificadas, novas são feitas, e a pressa é definitivamente inimiga da perfeição. 

Comer é apenas um pretexto para se socializar. É uma pena que a aceleração da vida moderna nos obrigue a degustar tudo muito rapidamente em fast food.  






sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Diminuição do estado versus bem-estar social

Qual é a função do Estado? De que tamanho ele deve ser? Quais são suas prioridades e prerrogativas? Essas questões não são novas, no entanto, todas às vezes que uma crise dessa proporção, sobretudo em regiões outrora centros da acumulação capitalista como a Europa acontece, esse debate volta à tona.

Ontem, na última conferência na Itália na Universidade de Gênova contando com a presença de italianos especialistas em Brasil essa foi a tônica. Está claro que o problema da Europa, grassada por uma grave crise financeira, é antes de mais nada uma crise de confiança. 

Desconfiança de que? No futuro. A questão é que depois da Segunda Guerra Mundial a Europa está retroagindo quanto aos avanços conquistados historicamente pela redução do Estado no que tange à qualidade de vida,  à educação, saúde e trabalho. 

É certo que o capitalismo é cíclico, portanto, depois que os europeus atingiram um patamar de vida em que  não necessitam mais de tanto consumo, já possuem duas, três casas, carros, o capitalismo avança para regiões onde possa se oxigenar: América Latina, Índia, Rússia e China.

Há ainda outros problemas: a indefinição entre esquerda e direita, a falta de projetos e direção social, essa falácia chamada austeridade fiscal que sacrifica questões importantes como educação, saúde, habitação. 

Na Itália, por exemplo, toda família possui poupança, 80% dos italianos vivem em casa própria, existem famílias que vivem da produção agrícola, não existe latifúndio na Itália, e os mais pobre sobrevivem com 700 euros. A questão é a falta de emprego para os mais jovens, a diminuição do consumo, mas, sobretudo, o que vai acontecer daqui para frente, já que as previsões mais otimistas falam de dez anos de crise. 

Ainda assim, existem 22% de pobres na Itália, leia-se, pobreza relativa, não se pode comparar com a brasileira, a taxa de desemprego chegou aos 25%, alta para os padrões europeus.

Nesse artigo não dá para explorar as contradições da comunidade européia e porque Itália, Espanha, Grécia e Portugal são os que mais sofrem com a crise, a questão é que países como o Brasil desde o governo Lula e agora Dilma apontam para um sentido contrário ao da Europa, ampliação do estado. 

Criticas à parte aos governos Lula e Dilma, tenho muitas, o Brasil começa a gozar de uma prosperidade econômica, da redução da pobreza, da elevação dos índices educacionais, do aumento do consumo, da renda, enfim, de todos os indicadores sociais. 

No Brasil as coisas estão muito longe de serem ideais, mas uma coisa é certa: temos um projeto, um futuro e  uma perspectiva, e a Europa? Há que repensar qual é a função, o papel e a importância do Estado.              

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Trieste-Veneza

Para Marcelo Cheche, Anna Casella, Frederico Lazzari, Alan Kardec, Helidacy Muniz e para o povo de Trieste. 


Esta é uma carta. Diferente. É uma carta aberta. Não é para falar de minhas aventuras pela Europa, mais precisamente pela Itália, e sim, da questão da sociedade decetiva, um conceito de Gilles Lipovetsky para designar a relação entre consumo e frustração coletiva, sobretudo em países em crise como Portugal, Espanha, Itália e Grécia.

Ontem pela manhã, ministrei em Brescia a primeira das três conferências que farei na Itália (Brescia, Trieste e Gênova) sobre o crescimento econômico brasileiro, para ser mais preciso a relação entre crescimento econômico e contradições sociais no meu país. Os italianos demonstraram muito interesse sobre o que vem acontecendo com o “gigante latino-americano”.

Depois da conferência, eu e minha amiga Anna Casella, antropóloga, Professora da Universidade Católica de Brescia, pegamos um trem até Trieste, extremo leste da Itália, divisa com a Eslovênia, cuja história é simplesmente fascinante.

Trieste pertencia ao império austro-húngaro, depois passou a ser italiana no final da Primeira Guerra Mundial (1918), durante a Segunda Guerra se tornou independente e só voltou ao domínio italiano dez anos depois do grande conflito. Cidade à beira do majestoso e imponente Mar Adriático, possui uma arquitetura austríaca, o famoso castelo de Miramar onde viveu Maximiliano antes de ir para o México, uma culinária peculiar, ruínas romanas, características multiculturais e, nela viveram simplesmente James Joyce, Umberto Saba e Italo Svevo, grandes escritores, romancistas, apaixonados pela cidade.

Ela guarda outra peculiaridade: é possivelmente a cidade mais fria da Itália e por lá costuma passar um vento por nome Bora, absurdamente forte, frio, gelado na verdade. Tive o “prazer” de ser apresentado a ele, na verdade tratava-se do “Borino”, filho ilustre.

Fomos recebidos pelo Prof. Francesco Lazarri, sociólogo da Universidade de Triste, que já morou no Brasil e nos apresentou a cidade. Foi uma noite agradabilíssima. 

Pela manhã, ministrei a conferência novamente sobre o crescimento econômico brasileiro e o paralelo com a crise econômica por que passa a Itália. E aí a questão da sociedade decetiva, ou da deceção entrou em questão.

No que constitui a sociedade da deceção? No mal-estar existencial, no vazio ultramoderno. E por quê? A moda, o hedonismo, o modismo tecnológico e afetivo, o individualismo triunfante passaram a ser responsáveis pela nossa felicidade.

Até a democracia virou objeto de consumo. Quanto maior for a probabilidade de aquisição material, maior será a insatisfação ao ver o que o outro tem o que nós não temos. Por contradição, a aquisição material não aumenta a felicidade, e sim, a frustração.

Até mesmo as relações afetivas foram tomadas pelo princípio decetivo, procuramos quantidade de relacionamentos, não qualidade como singularização da subjetividade em meio a uma sociedade de anônimos e cambiáveis.

Essa crise econômica europeia revela os limites do consumo como meneio de valorização do prazer e de busca pela felicidade. O problema é que o capitalismo é cíclico, portanto, a bola da vez é a América Latina.

Foi aí que o debate esquentou e a emoção tomou conta do auditório. Fiz minha crítica ao modelo de crescimento econômico brasileiro. Estamos fazendo uma reforma econômica, mas não a social. Se compararmos os dados entre crescimento econômico e índices sociais no Brasil, veremos que as coisas andam muito lentas. O brasileiro se pragmatizou e se inseriu na lógica do consumo; bom por um lado, péssimo por outro.

A emoção ficou por conta dos limites e impasses que o consumo implica, quer no Brasil, quer em qualquer lugar do mundo. Será que é esse modelo de hiperindividualismo, trazido pelos ventos do hiperconsumo, o que o mundo precisa? Penso que não. 

O debate foi conduzido para a questão da solidariedade entre os povos, pela integração cultural, pelo fim das barreiras econômicas e sociais, pela justiça social e igualdade.

Terminei olhando para o Mar Adriático, me enchendo de esperança, nessa cidade linda, fantástica, exuberante, cuja história é marcada por guerras e conflitos, deixada como marcas por suas ruas e vielas em homenagem aos sujeitos históricos combalidos historicamente ali. Por toda a cidade existem nomes de pessoas que lutaram por Trieste.

Ali está enterrado o arqueólogo Winkelmann, por ela passaram Joyce, Saba e Svevo, por ela também passa o Bora, cuja força não é capaz de destruir a cidade, muito menos a esperança de superação desta ou de qualquer crise.

Obrigado Trieste, deste-me uma das minhas melhores experiências da minha vida. Nunca vou esquecer!!!! Estou absurdamente feliz.  

De lá, eu e Casella tomamos um trem até Veneza, La Sereníssima, e vimos o que o homem é capaz de fazer com sua capacidade de superação e criação. 

Ps: Marcelo, Alan e Lila, dessa vez eu não paguei multa por tomar o vagão errado indo para Veneza. Risos...

Marcelo, obrigado por tudo, sem você essa viagem não existiria.

Monica, o jornal de Triste se chama Il Piccollo.  


   

   


               



terça-feira, 20 de novembro de 2012

Memoráveis

Para Sara, Bruno e Davi


COISAS PARA SE GUARDAR: 

Estava escrito num metrô de Lisboa: “Ser autor é trazer-nos inédito o que ainda pertence ao conhecimento geral”; 

Admiro as pessoas que nunca deixam de existir”;

Uma chuva fina escorre a água levando a folha seca que caiu do outono;

O bacalhau no restaurante do Seu Antonio em Picoas;

O Tejo que é de uma dimensão do mar;

Visitar a terra dos meus antepassados em Vila do Conde;

Saborear uma “francesinha” em Guimarães;

Perceber os olhares que dizem tudo; é um ser sem ser; um não querer sabendo por que; um não-falar porque a mudez é a melhor forma de expressão; um não-tocar porque sente; 

Ver a espumosa banhando a avenida do Brasil no Porto;

Pisar a areia grossa do mar do Porto, sentir a água gelada encharcando meu tênis de pano, molhando as meias, banhando os pés;

Ver o mar agitado arrebentando nos faróis;

Não ter palavras diante da beleza da Ribeira;

Andar nas nuvens olhando o Porto lá embaixo lembrando um presépio, ver as luzes da cidade refletidas no D’ouro como espelho de uma noite de céu estrelado;

Morrer de rir com as loucuras de Sara, estupefar-se com a inteligência de Bruno;

Se emocionar ao ver as lágrimas do miúdo Davi se despedindo de mim, não entendendo seu português gálico, mas compreendendo que a linguagem do afeto é universal;

Jogar uma garrafa ao mar com um bilhete: “meu lugar é onde meu coração está. Ele está com minhas filhas e aqui agora ao mesmo tempo”;

Dar uma fugidinha em Madrid, comer um pato ao molho de salsa;

Dar boas notícias às pessoas;

Sentir os olhos mareados ao falar com minhas filhas;

Ser recebido calorosamente pelos meus amigos Cesar Paltriniere e Anna Casella na Itália;
  









domingo, 18 de novembro de 2012

Saiu o resultado do teste de Aids (SIDA) de meu amigo

Meus caros,

Me chamo José Henrique de Paula Borralho; sou funcionário público, residência fixa, Professor Universitário, moro na cidade de São Luis, pai de duas filhas. Vivo de minha renda, não tenho interesse financeiro ou outros que não os do meu rendimento. Não tenho problemas na justiça, nunca tive, coloco-me à disposição da justiça e do ministério público brasileiro para quaisquer esclarecimentos.

Há mais ou menos 30 dias atrás conheci o Sandro que viaja frequentemente à Nigéria e tem contatos com as ervas que prometem a cura da aids (SIDA). Como tenho amigos soros positivos, interessei-me em saber do tratamento e das possibilidades de cura. 

Na ocasião soube que um grande amigo meu, não posso revelar o nome, fazia o tratamento com ele. Tomando o medicamento há 15 dias a carga viral dele havia baixado consideravelmente. 

Me comprometi a revelar o resultado dos exames caso negativasse o vírus. Desde então, centenas de pessoas tem entrado em contato comigo pedindo-me informações sobre o tratamento.

Não sou médico, biológico, infectologista ou coisa do gênero, sou professor de História da Universidade Estadual do Maranhão. Não tenho contato com o médico nigeriano, não sei como é o tratamento, como procede, a única coisa que sei é o que o Sandro acaba de postar no meu blog que o resultado negativou. 

Não estou no Brasil, estou num café no aeroporto de Lisboa e daqui a poucos instantes vou tomar um avião para Milão, portanto, não tenho condições de dar maiores informações. Não falei com o meu amigo, nesse exato momento são 5 horas da manhã aqui em Lisboa, portanto, não vou ligar nesse horário e não tenho como saber maiores detalhes. 

Vou repetir: não sou intermediário, não tenho interesse financeiro, não recebo comissão, nada, absolutamente nada.  

Quem quiser obter maiores informações a meu respeito, chegarei ao Brasil dia 27 de novembro, ministro aulas todas as segundas e sextas-feiras no prédio de arquitetura, rua da estrela, centro histórico de São Luis e todos os outros dias trabalho no campus universitário Paulo VI, bairro do São Cristóvão.

Essa notícia, caso se comprove a veracidade, é simplesmente revolucionária. 

O e-mail do Sandro é: sandronobre1545@hotmail.com 

Entrem em contato com ele.  A todos, boa sorte e vamos torcer!!!

Segue abaixo a postagem do Sandro Nobre:


Prezado Henrique Borralho, "nosso amigo" recebeu quarta feira próxima, o teste de sua carga viral, adivinha qual o resultado? - O resultado deu "INDETECTÁVEL", ou seja, ZERADA!!! Então ele foi orientado para fazer o teste final, positivo/negativo, no final deste mês em curso.
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Estou muito feliz com essa notícia.

Que Deus nos abençoe           

sábado, 17 de novembro de 2012

Ocasionais

 Beco do Recolhimento. Uma casa toca uma música de um cantor brasileiro em cujo trecho diz: “meu melhor amigo é um violão.

Cerca velha, portas  do sol , sécs. VIII-XII, Rua Norberto de Araújo, uma dupla sertaneja brasileira toca numa casa cujo trecho de uma música diz: “do jeito que você me olha vai dar namoro”.

Uma frase pichada na parede: “não pode haver paz no mundo enquanto houver guerra no amor.

Qual a probabilidade desses encontros casuais: uma muralha medieval, uma frase para o fim da guerra no amor, canções de um cantor brasileiro e de uma dupla sertaneja numa Lisboa fria e ensolarada de uma manhã de inverno?

Toda a atmosfera amorosa é ritmada pelas dobras do sino cadente como o ritmo lento do tempo quase imóvel.

As canções de amor cruzaram o Atlântico trazidas por essa brisa a beijar minha boca.

Teus olhos fechados, o sol na tua face, cabelos escorridos, uma câmera no ombro e a paisagem fotografada pelos teus olhos fechados.

Já não sei o que é mais bonito? As muralhas e a cidade fortificada ao fundo ou tua graciosa e suave presença-impalidez a roubar a cena.

Diante de ti até as muralhas se curvam.    





















quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Mais alto lugar

– Capitão!!!! Terra à vista!!! 

É linda, ainda que distante; dá para se ver o cume das montanhas, nevoeiro por sobre sua silhueta, o poente na espinha dos rochedos, árvores frondosas, a praia, nenhum barco ou sinal de gente. Daqui de cima é mais agitado, joga e balança muito, mas a vista é privilegiada.

Colocar o marinheiro no caralho, como era chamado o lugar mais alto de uma caravela, era uma punição; lugar insólito, inseguro e absolutamente claustrofóbico, além de perigoso, ele poderia cair lá de cima, era melhor ficar na proa, lugar para andar, se locomover e mais seguro.

Mas como tudo na vida tem seus reveses, ficar na casa do caralho era também um privilégio, afinal, do alto via-se tudo primeiro e melhor. Era como desfrutar da cereja do bolo antes de todos, sentir a brisa mais de perto, ver os pássaros, estar com eles, voar como se fosse um deles.

Lá de cima também se via a agitação da proa, os jogos brutais dos outros marinheiros, suas inquietações, disputas, os ratos em busca de restos de comida, o cheiro putrefato de arinheiros sem banhar, apenas água salgada, bocas rachadas, rostos impaludados, cheiro de carne humana.

Depois que se aprendia a jogar conforme a dança do mar, o caralho já não era um lugar ruim. Dava para adivinhar como o barco iria jogar a partir das ondas que se avistava ao longe. Também tinha outra vantagem: em caso de naufrágio era o último lugar a submergir, logo, o homem que estava nele, o último a morrer. 

Mas o melhor mesmo era estar nas nuvens, sozinho, completando-se a linha do horizonte, por onde somente os homens que enxergam à frente são capazes de ver. 

Os que estavam nesse lugar “privilegiado” sabiam que depois de toda e qualquer tempestade sempre vinha a bonança. A punição se transformava em privilégio, a solidão, a melhor das companhias. Sem ter com quer conversar durante muito tempo, os que ali ficavam, ao descer, tinham muitas histórias para contar, as melhores de todas, recheadas de visões que somente eles tinham visto.  


   



Entrevista com Arton, de Sirius. Parte II

  Entrevista realizada no dia 14 de fevereiro de 2024, às 20:00, com duração de 1': 32'', gravada em um aparelho Motorola one zo...