Para Minha irmã Bete
Regresso
(Poema de Amilcar Cabral, música de José Agostinho)
Mama velha vem ouvir comigo
O bater da chuva lá no seu portão
É um bater de amigo
Que vibra dentro do meu coração
Venha mamãe velha vem ouvir comigo
Recobre as forças e chegue-se ao portão
Que a chuva amiga já falou mantenha
E bate dentro do meu coração
A chuva amiga mamãe velha
A chuva que há tanto tempo não batia assim
Ouvi dizer que a cidade velha
A ilha toda em poucos dias já virou jardim
Dizem que o campo se cobriu de verde
Da cor mais bela porque é a cor da esperança
Que a terra agora é mesmo o Cabo Verde
É tempestade que virou bonança
Da cor mais bela porque é a cor da esperança
Que a terra agora é mesmo o Cabo Verde
É tempestade que virou bonança
A música nos adentra e nas nossas lembranças faz morada.
Tem algo de sinestésico nas canções; nos reporta a sensações e episódios
já vividos, nos retira de nosso estado de espírito, nos arrebata e nos joga
para uma outra dimensão.
Eu cresci ouvindo “Regresso”, na voz de Alcione. Quem
sempre cantarolava era minha irmã Bete, a mais velha. Não entendia bem a letra,
mas gostava muito da sonoridade.
Muitos anos depois, morando no Rio de Janeiro, aquecendo
para uma apresentação de tambor-de-crioula da Companhia de danças Mariocas, os
irmãos gêmeos Rômulo e Ramon colocaram um dvd sobre Cesária Évora. Automaticamente
me lembrei de minha irmã, de Alcione e de minha infância.
O que era ainda mais curioso é que a apresentação
aconteceria na Faculdade Santa Úrsula no Rio de Janeiro – que contem
um contingente razoável de estudantes caboverdianos –, para o presidente
daquele país.
Após a apresentação, tive o deleite de conversar com os
caboverdianos e aprender mais sobre sua cultura. Não faltou, claro, nas
conversas a figura de Cesária Évora, minha porta de entrada sobre aquele país
composto de 10 ilhas.
A letra da música, poema do fantástico Amilcar Cabral e
música de José Agostinho, foi uma das portas de entrada de Cesária Évora no
Brasil, pela voz de uma também negra, na verdade marrom, Alcione. Essa música é
uma das responsáveis pelo conhecimento da sonoridade da voz mais conhecida de
Cabo Verde.
Cesária faleceu em 17 de dezembro de 2011 em Mindelo, Cabo
Verde, seu local também de nascimento, tendo seu corpo enterrado ali, onde a
chuva após lavar a terra verde cobriu os caboverdianos de esperança, afinal,
tal cor está no nome de seu país, e o túmulo de Cesária Évora virou um imenso
jardim, vibrando os corações, leia-se, o centro das 10 ilhas caboverdianas.
vem manhanha
ResponderExcluirtraz cuscus e leite de cabra
fresco como a manhã
fresco como encontro
nem catchupa e ovos escalafados
marcaram o momento
não ilha onde
suar
sangue
até ADN perde o caminho
sem regresso
e apenas manos
damos mãos
calejadas clamam
também e agora sentimos
o flagelar do vento leste
ou o flagelar do vento do ocidente