Pororoca
Por Ria dourada e Mar agitado
Eu, rio, tu, mar,
encontro impossível
mas Deus fez chegar
entre vai e vem do mar
o rio está a te esperar,
na calmaria do tempo
na hora de te encontrar,
vem mar,
nesse encontro capaz de nos misturar,
transformar sal em doce,
para o eterno rio(a)mar.
Recebe as águas onde desagua rios de mar amar,
vem com força e encontra a resistência leve das águas de rio,
o mar salgado,
o rio doce,
água agridoce,
o mar impetuoso morrendo nos doces lábios de rio
se confundindo,
virando um só,
eu, agora também rio,
rio por não saber mais quem sou,
choro,
não é tristeza,
é alegria por se perder em tuas águas,
e já que lágrimas são salgadas
ao chorar não sabe se ainda é,
pois então seremos eternamente uma só água de um rio(a)amar .
O Medo
Khalil Gibran
Diz-se que antes de entrar no mar
um rio treme de medo.
Ele olha para o caminho que percorreu,
dos picos das montanhas,
A estrada longa e sinuosa que atravessa florestas e aldeias.
E na frente dele,
ele vê um oceano tão vasto
que entrar só pode significar
desaparecer para sempre.
Mas não há outro caminho.
O rio não pode retornar.
Ninguém pode voltar.
Voltar é impossível na existência.
O rio precisa correr o risco
indo para o oceano
porque só então o medo desaparecerá,
porque é aí que o rio vai saber
que não se trata de desaparecer no oceano,
mas para se tornar o oceano.
Com Khalil Gibran, Ria Dourada, Mar agitado, sem esquecer de Guimarães Rosa
Flávio Lazzarin
Em vez de se deixar levar pelo rio
obrigados a perder o medo
de se tornar oceano
Em vez de esperar
pela piedosa pororoca
que nos salgue bem adentro
nos conhecidos mapas do nosso eu
antes da implacável correnteza nos levar à foz
buscamos a terceira margem
a que contesta o fluxo
que enfrenta o rio
o tempo
o destino
o fim
e as suas metáforas
a margem que extrapola
a margem dos poetas, dos rebeldes, dos inconformados.
Agosto 2023