Tempos eflúvios. Nuvens por sobre a cabeça. De onde
elas vêm? E se estão dando voltas por sobre a terra desde os tempos
imemoráveis? E se elas sempre passam observando quem as observa? Elas se
dissipam? Desaparecem? Se desaparecem, o que acontece com os pensamentos
confidenciados a elas?
Em cima do telhado, Sebastião todas as tardes subia para
contemplação dos céus. Era uma atitude estranha, afinal, lá embaixo crianças na
rua, normais, brincavam de bola, chuta-lata, pegador. Coisas que crianças
mormente fazem.
O tempo, essa atmosfera de bolha, esse amálgama que a tudo
devora, era uma preocupação de Sebastião. Ao longe ele ouvia os badalos dos
sinos da igreja, começavam sempre ao meio-dia. Era uma forma das pessoas
saberem que horas eram. Olha que engraçado!!!! As pessoas já se guiaram das
horas a partir dos sinos... Quanto tempo...
Já houve tempo em que os sinos das igrejas além de marcarem
as horas determinavam o momento das pessoas rezarem, a bem da verdade, o tempo
das orações é que dividia o dia das pessoas. Cada badalo, tempo de uma oração.
Mas isso Sebastião só foi saber muito depois.
De uma em uma hora os sinos tocavam. Às vezes se confundiam
com a sirene da escola marcando o fim de uma aula e o começo de outra; às vezes
a sirene era para dizer que havia acabado o recreio. O barulho das crianças
brincando no pátio era algo familiar. Gostoso de ouvir.
Sirene da escola, crianças no pátio, brincadeiras na rua,
as nuvem que passavam, tudo num só tempo que necessariamente não se confundia
com o de Sebastião. Ele estava ali no telhado, lugar aberto, amplo, sensação de
liberdade, corpo nas telhas e o pensamento dele nas nuvens. Era como se
quisesse que as nuvens o levassem consigo.
Somente uma coisa conseguia o tirar daquela sensação
absorta: os badalos dos sinos. Quando tocavam três vezes indicando a terceira
hora da tarde sabia que dali a poucos instantes teria que descer do telhado e
pôr os pés no chão, já que no telhado estava solto e leve como os pensamentos
sempre nas nuvens. Estar ali em cima era uma forma de dar leveza aos pés,
fazê-los acompanhar a bruma. O chão era duro demais para pés pequenos como
aqueles que sempre pensavam como a cabeça.
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