sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Enigma

Philipe era um graduado em Comunicação que havia tempos disputava uma vaga como jornalista no jornal Antes do Amanhecer. A lista dos seus concorrentes era grande. No dia do teste, teve que redigir uma crônica política, sua área de interesse, já que não gostava da página policial, nem do caderno de esporte, tampouco de culinária.

O tema escolhido para a crônica foi um ano importante na história da humanidade. Como nunca foi bom em história, se lembrou do romance Em 1926: vivendo no limite do tempo, escrito por Grumbrecht, em que o autor escolhe exatamente tal ano por não ter acontecido nada de importante.

Então, com uma boa dose de imaginação escolheu 1671. Inventou mil histórias, narrou sobre batalhas, heroísmo, disputas políticas e deu-lhe ares de divisão da história da humanidade, ou seja, sua crônica tinha um Q de inverossimilhança. 

Como o editor-chefe por sua vez também não conhecia muito bem história, ficou impressionado com a articulação dos bastidores da política tão bem redigido por Philipe. Perguntou-lhe se tinha também graduação em História, se estudava diplomática, tinha interesse nos enciclopedistas, se era uma espécie de antiquário – como eram chamados os historiadores no início da época moderna. Respondeu ser apenas um estudioso da matéria, já que sempre se interessou por política. 

Philipe de fato era muito astuto. Escolhera um ano sem grandes repercussões políticas, assim disfarçava o fato de não saber muita coisa sobre o que estava fazendo e usar uma boa dose de imaginação, tal como o romance Baudolino, escrito por Umberto Eco, cujo personagem é um misantropo empedernido, contador de lorotas que todos acreditam ser um grande historiador.

1671 não era um ano importante, a não ser pelos seguintes episódios: a instalação das primeiras indústrias têxteis em Portugal, o Visconde de Barbacena virar Governador-Geral, e o lamentável episódio da expedição militar do mestre-de-campo Francisco Barreto contra Palmares. 

1671 não era necessariamente um ano escolhido por Philipe, era a chave da superação, o código da vitória.  Escolhera tal número por razões que só ele sabe. Ele conseguiu enfim o emprego.     
  

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