quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O 7 de setembro como festa anti-civica

Hoje pela manhã acordei, liguei a televisão e lá estava a esquadrilha da fumaça fazendo pirotecnia numa esplanada dos ministérios, ainda que lotada, dando a sensação de vazio de gente. É sempre assim nos 07 de setembro: a festa que deveria ser cívica, com pessoas comemorando a independência, é antes de tudo uma parada militar é não é difícil entender porque. E olha que esse ano a Dilma cortou em R$ 100.000,00 (cem mil reais) os gastos com o desfile em relação ao ano passado, custando ao erário a desse ano uma bagatela de R$ 900.000,00 (Novecentos mil reais).

Por que o dia da independência do Brasil não é uma festa cívica como nos Estados Unidos com os 04 de julho ou na França com as comemorações da Queda da Bastilha, nos 14 de julho? Porque aqui diferentemente desses países citados, a participação popular no processo de independência precisa ser relativizado e, pós-emancipação política de Portugal, frações de classes e setores populares se sentiram traídos pela elite política braziliense, que desejam tão somente a libertação do jugo metropolitano, já fissurado pela quebra do "pacto colonial" com a abertura dos portos em 1808, ditar suas condições econômicas na nova nação e a manutenção de elementos com a escravidão, pilar de sustentação da agroexportação brasileira. Resultado: escravos haviam desejado a independência do Brasil na esperança da abolição da escravatura; pobres militaram em alguns lugares nas lutas de independência no desiderato de mudarem suas condições econômicas; brazilienses bradaram independência ou morte com o fito de verem expulsos os portugueses que controlavam o aparato burocrático do estado, ocupavam posições importantes, controlavam o comércio. Ou seja, qual de fato era a perspectiva de criação de uma nação pautada em ideais de fato populares, ou que ao menos chamasse para a composição política diversos setores sociais? Vide o combate incisivo contra a Confederação do Equador e o que aconteceu anos mais tarde com a outorgação da Constituição de 1824, a ditadura de D. Pedro I criando o poder moderador, e a forma sanguinolenta como se combateu as revoltas civis como Balaiada, Cabanagem, Sabinada e Farroupilha. 

O resultado disso se sabe muito bem. Na montagem do aparato burocrático do estado brasileiro, já emancipado, prevaleceu os interesses classistas, controlado por famílias ricas e donas de centenas de hectares de terras, os latifúndios, o familismo político que comungava proprietários ricos e burocratas do estado, o voto censitário, o voto de cabresto, o coronelismo, a exploração social, a indissociabilidade entre entre o público e o privado do estado, os favorecimentos, clientelismo, a partidarização judiciária e um percepção nítida dos brasileiros de que no Brasil o estado não era uma entidade fenomenológica que estava acima do bem e do mal, a serviço do bem comum, mas antes, uma estância de favorecimentos de quem ocupava o Estado. Consequência: comemorar o que? Decorridos 189 anos do grito do Ipiranga o povo brasileiro assistiu bestializado a corrupção deslavada e cínica, o descaso, a não aplicação de recursos em educação, saúde, transporte, habitação. Viramos piada internacional, só sentíamos orgulho de sermos brasileiros em época de copa do mundo ou quando Ayrton Senna vencia na fórmula 01 aos domingos. 

Mas acho que as coisas estão mudando. Pela internet mobilizou-se o país inteiro contra a corrupção nos desfiles de 07 de setembro Brasil afora, tal como o movimento O Grito da Terra faz já há muitos anos. Houve indignação contra os sucessivos casos de corrupção, o brasileiro se pintou de preto e protestou dando novas cores ao verdeamarelismo meio forçado dessa data, um patriotismo meio envergonhado. 

Espero que esse movimento ganhe força e que o jornalista espanhol que publicou no jornal madrilenho El Pais afirmando: "Que pais é esse que reúne milhares na parada gay, outros milhares em marchas evangélicas, centenas na marcha da maconha mas não protesta contra a corrupção?", veja mudanças significativas no nosso país e que efetivamente tenhamos orgulho não só de nossa independência, bem como de nossa emancipação em todos os sentidos.

Parabéns ao movimento NAS RUAS. E viva a força da mobilização, nossa única saída.        





               

Um comentário:

  1. Por que o dia da independência do Brasil não é uma festa cívica?

    A resposta não é simples, mas pode ser fácil dizê-la. Como falava Mário Quintana, “Quando o leitor pergunta ao poeta o que poema quis dizer, um dos dois é burro”. Vou tentar não ser tão burro, sem a menor segurança de conseguir. Comemorar é celebrar. Celebrar é solenizar uma festividade. Porém e para tanto, necessita motivo à altura. Independência? Quem é que se sente independente? O Brasil não depende de quem? A gente depende do Brasil, mas o país não “depende” de nós porque faz o que quer como se jamais dependesse. Dia 07 é um ótimo dia que precede o dia 08 e quando 08 é quinta a gente pode imprensar a sexta e ter magicamente na mesma semana dois finais de. Alguém também notou a felicidade estampada em todo mundo na última terça-feira? Pois é? Seria prolongadão! – “Tu vai fazer o que neste feriado?” “Vai viajar pra onde?”. Quem não se articulou responde de imediato: - “Vou descansar”. Ser independente cansa, mas ser dependente torna as pessoas exaustas. É clara a noção imediata de que as pessoas vão imediatamente fazer outra coisa em outro lugar. Ninguém abre mão de um buraco que se abre no cotidiano para comemorar algo importante e foge se esse algo fosse realmente importante pra si. Elas estão erradas? No Maranhão a coisa se agrava, a gente tem esse e um pouco antes tem a tardia e invisível Adesão. Para comemorar Independência o espírito necessita ter certo gosto de liberdade na boca. Não importa qual seja a “desculpa”, o que a gente sente é alívio porque é feriado e a gente não vai! O imposto sobre o chá ainda se impõe e a Bastilha ainda nos detém. Em todo protesto há minimamente uma tensão. A parada gay não protesta nada, pelo contrário, festeja! Este sim é um movimento de independência que celebra porque lutou, conquistou e se sente livre. No Brasil, ser gay já é fácil, difícil é ser independente.

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