No bom português brasileiro – se bem que para alguns
linguistas já não é mais português brasileiro, e sim, brasileiro apenas, ou
seja, uma nova língua –, mijar é a mesma coisa que urinar, fazer xixi,
pipi, verter água.
No caso especial do Brasil, grosso modo, urinar não é uma
característica do espaço privado, e sim, público, na rua mesmo, em qualquer
lugar que der. Se tiver apertado, é só desarrochar o buriti, abrir as calças,
calção, enfim, botar o pênis para fora e sem pudor fazer ali mesmo, na frente
de todo mundo, sem vergonha.
Em São Luís do Maranhão, cidade sem
banheiros públicos, pouco esgotamento sanitário, espaço onde há ainda
muita área verde, mas que a especulação imobiliária já está tratando de
desmatar, é muito comum ver muito marmanjo e até mulheres fazendo xixi,
mijando, urinando em pleno espaço público. Já é tão corriqueiro que as pessoas
nem ligam mais. É a máxima expressão da naturalização proposta por Foucault
acerca do sexo, segundo ele, quando as pessoas naturalizarem o sexo, deixará de
ser um tabu. Pois bem, Foucault, se estivesses vivo, verias que tua reflexão
teórica teria total comprovação na cidade de São Luís. Já virou parte da
paisagem urbana. O elemento novo são as chuvas torrenciais nessa época do ano,
é chuva misturada com mijo descendo vala abaixo.
Além de ser uma característica cultural, e, exatamente por
ser uma questão cultural, mijar nas ruas de São Luís é uma herança
do período colonial, quando os tigres (escravos) a mando de seus
senhores jogavam as fezes nas praias e espaços urbanos da cidade.
Não havia e ainda não há uma clara distinção entre o que é
publico e privado, por isso as pessoas não se sentem constrangidas em fazer no
espaço público o que fazem em casa. E aqui não se trata de uma crítica a quem
faz xixi nas ruas, se fazem é porque não há espaço público para isso, vez que
necessidades fisiológicas todo mundo tem e ninguém pode prever quando dá aquela
vontade arretada de mijar ou fazer um 2, defecar, no bom brasileiro, língua me
refiro. Número 1 é urinar. Esse código de 1 ou 2 uso com minhas filhas.
Essa questão de indistinção entre o que é publico e o que
privado está na ascese da formação do estado brasileiro. O estado brasileiro
nasceu como qualquer outro para beneficiar os setores de dominação, privilegiar
grupos de classe, por isso a população nunca se sentiu identificada ou
representada pela estância política. Essa não dissociação entre o que é
público e privado se transmutou para a convivência urbana, na verdade, o espaço
urbano era a representação da relação privada com o espaço publico.
Por isso que é muito comum em São Luís vizinhos colocarem
música alta, pessoas circularem com seus carros nas praias, levantarem os portas-malas
com suas parafernálias tecnológicas e colocarem o som a toda altura. Se
você se meter a besta de reclamar vai tomar um sonoro: – “Os incomodados que se
retirem”... Ou seja, por ser público, eu faço o que eu quiser, quando deveria
ser ao contrário, por ser público, não se pode fazer o que se quer, e sim, o
que a coletividade deliberar, afinal, o espaço é público e não privado.
Apesar disso, quer dizer, de mijo para todo o lado, a
cidade de São Luís não fede a mijo, depende do local. Existe um teste de uso de
banheiro público que consiste em saber quanto tempo alguém consegue
usar tal local segurando a respiração. Se der para segurar sem morrer asfixiado,
então tá liberado.
Considero o ato de urinar em público um ato de
contravenção, não de falta de educação. Numa cidade provinciana, dominada por
sucessivas oligarquias desde 1845, sem parques, sem praças decentes, cheia de
buracos, suja, imunda, sem banheiros públicos, engarrafada, com feiras imundas,
baixo esgotamento sanitário, mijar nas ruas é apenas mais um dos componentes de
uma cidade cuja população nunca se sentiu prestigiada, respeitada ou mesmo
vislumbrada por políticas públicas construtora de espaços públicos.
Atentado ao pudor? – Mas como, seu guarda, vou fazer minhas
necessidade onde, se estou apertado?!!! Pode dizer perfeitamente qualquer
morador que numa situação de perigo, descer do ônibus, parar o carro, procurar
um lugar mais escondidinho e sentir-se aliviado. Ufa!!!! Pensei que fosse mijar
nas calças!!!!!
Portanto, se virem alguém mijando, urinando, fazendo xixi,
número 1 por aí, não vão pensando que isso é um atentado ao pudor, é tão
somente um componente da paisagem urbana desta cidade que em pleno século XXI
ainda está em alguns aspectos em pleno século XIX
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