Fui visitar minha amiga Edna, minha ex-professora de
francês, moradora da Vila Isabel, bairro sorridente, de uma atmosfera que muito
me apraz. Além do reencontro, dos afetos recobrados, das boas lembranças de
quando íamos impreterivelmente toda semana ao teatro, sempre por
incentivo dela, trouxe na bagagem de presente gentilmente dado por ela a obra
do francês Gilles Lapouge: Dictionnaire
amoureux du Brésil (Dicionário
amoroso do Brasil).
Gilles Lapouge, jornalista do Estado de São Paulo, fez uma
série de viagens pelo Brasil desde que aqui chegou. Essa obra acima citada
trata-se de uma incursão por vários lugares do país, notadamente o Nordeste
brasileiro.
Ao folhear o livro, encontrei um capítulo dedicado à minha
cidade intitulado: Gare de São
Luis (estação de trem de São
Luis). Entendi o presente singelo de Edna. Não havia me dito nada. O capitulo é
singular, pequeno, mas profundo.
Por que alguém escrevia sobre a estação de trem de São
Luis? Quem conhece a cidade e a estação entenderia o olhar arguto do
jornalista.
Diferente dos viajantes do século XIX que passaram pelo
Brasil, muito deles franceses, Lapouge não se coloca numa condição de
colonizador, como quem visita o estrangeiro com ar de superioridade, tão bem
representada na obra do memorável Prof. José de Ribamar Caldeira
sobre os relatos dos viajantes que passaram pelo Maranhão no século XIX.
O livro é um dicionário amoroso, logo, não se trata de
comparações culturais entre este ou aquele país, mas uma forma singela de olhar
para o Brasil num momento em que o próprio país não se reconhecia. No entanto,
mesmo se tratando de uma admiração, a descrição do autor sobre a estação de trem
é subliminar, subjaz uma crítica que talvez nem ele mesmo se deu conta.
Construção arquitetônica meio nababesca, a estação de
trem de São Luís, hoje uma delegacia de Polícia, foi erguida numa fase já de
decadência econômica do Estado. Antiga estação São Luís-Teresina, Lapouge queria
ir de São Luís a Fortaleza de trem, mas questiona a falta de infraestrutura da
malha ferroviária do país numa época em que ainda se viaja de cavalos, burros e
de barco, logo depois, de carro e ônibus.
A questão subliminar colocada é: por que aquela construção
numa cidade de pouca movimentação ferroviária? Lapouge sem se dar
conta estava criticando a opulência da elite maranhense, os jeitos
soberbos de uma sociedade que de forma imperiosa se recusa a olhar para frente
e se engrandece do passado. Pura melancolia.
A viagem seguiu e a opulência da estação ficou
para trás como um quadro de uma sociedade ensimesmada, autorreferenciada,
entrópica. À frente, a paisagem do Nordeste; a beleza do relevo,
morros, vegetação, gente, animais e o olhar apaixonado por um estrangeiro
pela terra brasilis.
Eu fico todas as semanas, aguardando tuas belas crônicas e, confesso, a espera sempre é brindada com uma leitura gostosa, aprazível. Parabéns e, que venham as outras!
ResponderExcluirquerido (a) anonima. como é bom saber que aquilo que a gente escreve é esperado por outras pessoas. obrigado pelo incentivo. vou continuar escrevendo na esperança de que possas continuar a lê-lo.
Excluirabraços do henrique