sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O poder da comunicabilidade em ambiente virtual

Sempre fui contra as redes sociais virtuais. Nunca gostei do caráter invasivo da privacidade dos seus usuários - uma negação da construção da individualidade, da privacidade dos novos sujeitos atrelados ao nascimento da modernidade, coadnuda pelo afloramento do estado, do direito e da condição jurídica moderna. Espaços como Orkut, face's e congeneres, permitem uma vigilância dos comportamentos e ações no sentido da máquina panóptica explorada por Foucault. Além do caráter do simulacro dos não-lugares, como chat's, por exemplo, que, em tese, aproximam as pessoas em várias partes do mundo, ao mesmo tempo em que as distanciam pela possibilidade de dissimulação da identidade, acentuada pela ausência física, sem falar da procura por "amores líquidos", para usar uma expressão de Bauman, colocando todos ou quase todos usuários desse instrumento como simulacros de si mesmos.  

Há, além dessas questões, outros problemas como as novas sociabilidades encetadas pela ferramenta virtual; o apego à necessidade da velocidade do cyber espaço que nos lança numa atmosfera de consumação da tecnologia, das novidades desse instrumento, da insurgência de novos meneios da internet, da sensação de que a vida sem ela é impraticável, tornando inelutável qualquer possibilidade de resistência, do surgimento de novas linguagens afetando inclusive as línguas formais, do processo de exclusão social e digital de quem não usa ou domina esse instrumento, da aceleração do tempo e da história, da perda da memória, até a banalização do próprio espaço, perdendo de vista seu caráter revolucionário, inquietante do ponto de vista das múltiplas possibilidades de transformação social via informação e, sobretudo, da questão por vezes despolitizante da internet e dos interesses colocados por detrás dela.

Os "donos da web" preparam um instrumento de controle do conteúdo e uso, alegando supostos abusos cometidos nela. Ou seja, a internet que serviu e serve de propaganda consumista das grandes marcas é também usada para protestar contra as próprias grandes marcas, além do caráter político, vide os acontecimentos no Egito, Síria e alhures que assustam os donos do poder.

Mas a questão mesmo é que a internet escapa da forma de controle de mecanismos de comunicação como a televisão, a imprensa, ainda que o formato futuro da web integre todos os tipos de comunicabilidade. E nisso vejo grandes problemas: grandes conglomerados controlando a integração dos grandes meios de comunicação. Para isso o movimento cyberpunk já prepara uma nova plataforma fora de qualquer controle, nos mesmos moldes de quando surgiu o Linux antagonizando a poderosa Microsoft.

Então, porque resolvi aderir ao facebook e ao blog? As primeiras criticas e os primeiros questionamentos vieram dos meus alunos. Como pode um professor de Teorias da História, de História Moderna, que ministra cursos como História e Pós-modernidade, História e cinema, por exemplo, ser tão reticente à essas ferramentas? O sinal amarelo acendeu. Comecei a perceber que corria o sério risco de não mais me comunicar com os meus alunos. Que poderia inclusive falar de coisas que eles não queriam ouvir, ou de estabelecer uma relação de não dialogicidade com eles. Percebi também que eles são mais imagéticos do que eu, possuem múltiplas habilidades, fazem coisas ao mesmo tempo, dominam ferramentas das quais tenho muita dificuldade e que portanto, estamos efetivamente em uma nova etapa, história das relações interpessoais e que, longe de ficar retinente ou resistente a isso, preciso entender como se dá esse novo processo.  

Assim surgiu o blog VERSURA, um conceito utilizado pelos escritores Giorgio Agambem e Alberto Pucheu Neto, de quem tomo emprestado tal acepção, que significa o desdobramento da palavra, suas voltas e meneios, tudo a serviço da livre reflexão e do pensar, não apenas poético, sentido utilizado por Agambem.

Esse blog não é específico sobre algum tema, é livre para se discutir Filosofia, História, Artes, Política, Antropologia, Sociologia, Cinema, Literatura, Cultura, Religião, Espiritualidade. Gostaria que fosse um espaço de ilação, de fruição, poético, energético, vibrante.

Dessa feita, não me rendi às redes sociais virtuais, fui convencido, porque há aqui também espaço para a contraposição, para o embate, para a crítica, protesto, utilizando tal ferramenta em um sentido ideológico, concepção tão démodé nos dias de hoje.

Nem tudo são flores no espaço virtual: da falta de acesso a universalização da internet ao uso político como instrumento de dominação, ainda não sabemos ao certo o quanto poderoso e de potencial tem para ser explorado. Na verdade alguns já sabem e fazem isso e usam muito bem.

Espero que os usuários desse blog. Façam bom proveito.


9 comentários:

  1. Henrique,você foi perfeito em suas colocações!Compartilho com tudo que está escrito.Bjs

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  2. grande Henrique! só faltou incluir a Arquitetura na sua lista, pois da Praia Grande aos Arcos da Lapa ela atravessa sua história.
    abrs.

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  3. "Me disse vai embora, eu não fui
    Você não dá valor ao que possui
    Enquanto sofre, o coração intui
    Que ao mesmo tempo que magoa o tempo
    O tempo flui..."


    É tão bom escrever sem notas de rodapé, citação, margens de contenção! Aproveitar o espaço sem se incomodar com o espaço é quase possível.
    Fuçando um site de compras, esta feira no escuro, me dei a alguns cliques e ontem ao chegar exausto estava a me esperar entre afazeres, o sofá, a cama e a noite, o DVD Ney Mato Grosso Vivo. Fui aos afazeres, ao sofá, à cama, mas hoje cedo a música Novamente me abriu o sábado, o dia. Acho que a gente já tomava coca-cola antes da internet, mas de alguma forma antes da coca-cola já havia o Ney. Ele é tão estético, sublime, seu corpo é metafísico, seu espírito pulsa, dança, levita, excede sem exagerar. Não há artista tão completo em parte alguma.
    Se há perigo em vender o que quer que seja via internet na velocidade que se deseja manutenir a alienação necessária ao títere, é inteligente comprar, pegar, baixar o que nos acrescenta, o que nos move por nós mesmos, o que nos aliena desta alienação primeira.
    Delonguei anos pra me adaptar ao celular, este aparelho que torna eficientíssimo o controle quando não sabemos que o botão Desligar bloqueia o poder que damos ao outro. Só tem uma coisa, quando o ligamos o outro que está ininterruptamente “conectado” está implacável, birrento, cobrando, irritado por ter perdido por alguns instantes o domínio ou a idéia disto. É como se a gente tivesse a obrigação de atender sempre. Mas o celular pode ser uma engenhoca “mágica” pra gente não morrer de saudade e não um eterno marca-passo vital para vigiar e punir. É óbvio que a velocidade que se imprimiu ditou um ritmo taquicardíaco. Quando se trata de emprego então, ninguém pode esperar, chama o próximo que provavelmente está conectado. Não é bem assim sempre, não caio nessa de um todo. Fora as pessoas que para seguir as promoções adquirem 3 celulares, ou um com 4 chips achando que estão economizando algo que não a comunicação, pois operadoras diferentes viram pressupostos para nem ligar e mesmo a suposta facilidade para se comunicar não ampliou o diálogo. Pra se comunicar é preciso tempo, tempo que a gente finge e acredita que realmente não tem. Se a gente não tem mais tempo pra beber uma cerveja com um amigo não é tempo que a gente perdeu, foi a amizade. Em falar em beber, quem nunca já foi vítima da frase: - “Tu só me manda mensagem quando bebe!’” ou “Tu só me liga quando bebe!’’. Adoro mandar mensagem quando bebo. As pessoas deveriam ficar contentes porque quando bebemos e lembramos especialmente delas, pois quando a gente bebe são as coisas mais importantes que a gente procura ou que vem ter conosco, e se aquela para qual a gente mensageou dispusesse de tempo para estar naquele momento provavelmente o celular estaria desligado. Um correio imediato que nos permite ser “insensatos” antes que a sobriedade censure nossos instintos. Celular também serve pra isto.
    [To be continua...]

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  4. [To be continua...]
    Ser blogueiro é menos rótulo que aparenta. Tenho menos resistência para estes espaços que tive com o celular, porque além de que ninguém escrevia um livro e desfolhava em folhetins pelos jornais cotidianamente, mas o tempo é que um dia exigia um livro. Não é necessário ter intencionalidade, é necessário ter um tempinho. Odeio modismo, mas decidi que a mim a moda há muito não está na moda, então ela não me afeta tanto. O pensamento é tão virtual quanto a palavra, quanto o sentimento. Acessar o outro ou bater na porta com ou sem convite e entrar ou invadir é inquietante quando tememos que vejam as coisas que não queremos que observem sem o nosso suposto controle ou permissão. Respeito os não-lugares, estares que podemos morar livremente sem condomínio fixo, pois o não-eu é o que nos constitui com maior pluralidade. O Eu é a cidade que inventamos para nos esconder, a fachada que deixamos para que encubra o que há atrás. O Palácio de Versalhes é tão belo, tão vasto, quase não permite ver o que está no terraço de forma tão clara. Nada nunca é tão claro e havia um “Rei Sol ali”.
    Exclusivo! Tudo é tão exclusivo. Que enigma humano, que privilégio! Exclusão social o livro impresso já permitia bem mais e melhor. Adquirir o livro ainda não garante que ele será acessado, há um traço invisível que torna a palavra volátil ou muda, a chave é outra coisa. Qualquer um tem que lutar muito para construir a sua, não há democracia no mundo que possua esse dom de sociabilizar prontamente ao outro esta chave tão idiossincrática, nem matemática que resuma esta equação à regra de três. Vamô escrevê, vamô! O máximo que pode acontecer é a gente se arrepender, mas é tão bom escrever sem notas de rodapé, citação, margens de contenção!

    César.

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  5. Nada contra as "resistências". Quem nao gosta de curiar? Muita gente, desde tempos longíquos, só que as ferramentas mudaram. Hj quero me permitir e experimentar, sem me preocupar com julgamentos de intelectualidade, de disso ou daquilo. O meu lema é: hj estou aqui amanha posso nao estar, nao falo desse espaco, falo de todos os espacos, sabe pq, por vários motivos, simplesmente pq posso cansar, talvez cansaco das mesmices, mas esta a carregamos como as transformacoes. Nao quero levar nada a sério e quero, lá vem a contradicao, p mim o q tá valendo é reter o q é bom, por isso estou aqui, vou curtir o q tiver de bom nessa (tua) esfera...

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  6. Amigão...fico muito feliz ao ler suas reflexões que ultrapassam o âmbito redondo da História e vasam para a sociedade e suas relações centrípetas e complexas. Aguardo mais. Fátima Gonçalves

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  7. Turma, obrigado pelos comentários. Valeu a força. leio sempre os comentários. abraços

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  8. Sou usuária assídua dos meios virtuais desde 2006, e dentre estes pude perceber quão grande vem tornando-se esse mundo, fiz parte do “moribundo” Orkut, adentrei no blog, msn, Twitter (o qual particularmente não curto), Facebook, My Space, dentre inúmeros outros e assim durantes estes 6 anos pude chegar a essa percepção.
    Para mim, torna-se de suma importância esse entenrece de contato com o virtual, com essa porta de globalização, onde o pouco pode-se tornar muito e o muito pode-se tonar grandioso.
    Assim, gostaria de parabeniza-lo Henrique, pela decisão de adentrar nesse mundo tão complexo e ao mesmo tempo tão simples, pequeno e ao mesmo tão imenso. Parabenizo-te pelos textos, poemas e comentários, nos quais tive a oportunidade de ler alguns, e tendo-os lido, cheguei à conclusão de ter encontrado não só uma fonte de conhecimento, mas também de suma reflexão. E são por estes e outros motivos que sua página, para mim, passará a ser meu blog que cabeceira. Parabéns!

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